OPINIÃO/CRUZEIRO: PLÁGIO
Escrito por ARCO em Maio 21, 2019
Plágio
Passei mais de uma semana, até me decidir, partilhar este conto de Kahlil Gibran.
Como ele, com as ligeiras adaptações, ainda é traduzível para os dias de hoje.
Assim, tomei a liberdade, de copiar e adaptar este conto, que espero, vá servir para cada um e cada uma de nós,meter a mão na consciência…
Dentes Podres
Eu tinha um dente podre na boca que me estava a incomodar. Durante o dia estava dormente, mas na tranquilidade da noite, quando todos dormiam, começava a doer.
Um dia, como estava a ficar sem paciência, fui ao dentista e disse-lhe para me arrancar o maldito dente que me fazia tão infeliz e me roubava o prazer do sono, transformando o silêncio da minha noite em lamentos e tumultos.
O dentista abanou a cabeça e disse: “ É insensato arrancar o teu dente se o podemos curar.”
Então, começou a perfurar os lados do dente, a limpar-lhe as cáries e usou todos os meios possíveis para o restaurar e libertá-lo da podridão. Quando acabou de perfurar, encheu-o de ouro e disse, gabando-se: “ O teu dente mau agora está mais forte e mais sólido que os teus dentes bons.”
Eu acreditei nele, paguei-lhe e vim-me embora.
Mas ainda não tinha passado uma semana quando o maldito dente voltou a doer e a tortura que ele me fazia transformava as belas canções da minha alma em gemidos e agonia.
Então, fui a outro dentista e disse-lhe: “Arranca-me este maldito dente, sem me fazer perguntas, porque quem leva as pancadas é diferente de quem as conta.”
Obedecendo à minha ordem, ele arrancou o dente.
Olhando para ele, disse: “Fizeste bem em arrancar este dente podre.”
Na boca da Sociedade há muitos dentes podres, doentes até aos ossos do maxilar. Mas a Sociedade não se esforça por os arrancar e para se ver livre do problema. Contenta-se com coroas de ouro.
São muito os dentistas que tratam dos dentes podres da sociedade com ouro brilhante.
São muito os que cedem às seduções destes reformadores e a dor, a doença e a morte são o seu destino.
Na boca da nação,ou distrito, ou concelho, estão muitos dentes podres e sujos que infetam e fedem. Os médicos tentaram fazer curas com coroas de ouro em vez de os arrancar. E a doença permanece.
Uma nação,ou distrito, ou concelho, com dentes podres está destinada a ter um estômago doente. São demasiados os atingidos por esta indigestão.
Se quiser ver os dentes podres da nação,ou distrito, ou concelho, visite as suas escolas, onde os filhos e as filhas de hoje se estão a preparar para serem os homens e as mulheres de amanhã.
Visite os tribunais e assista aos atos dos que administram a justiça, desonestos e corruptos. Veja como eles brincam com os pensamentos e as mentes da gente simples, como um gato brinca com um rato.
Visite as casas dos ricos, onde reinam a vaidade, a falsidade e a hipocrisia.
Mas, não se esqueçam de passar pelas barracas dos pobres também, onde moram o medo a ignorância e a cobardia.
Depois visite os dentistas de dedos ágeis, com os seus instrumentos delicados, moldes de gesso e calmantes, que passam o dia a tapar as cáries nos dentes podres da nação para esconder a decadência.
Fale com aqueles reformadores que se fazem passar pela nossa elite intelectual e organizam associações, dão conferencias e fazem discursos em público. Quando falar com eles vai ouvir músicas que talvez pareçam ser mais sublimes do que a moenda de uma mó e mais nobre do que o coaxar de sapos numa noite de Junho.
Quando se lhes disser que andamos a mastigar o seu pão com dentes podres e que cada pedaço que mastigam está misturado com saliva envenenada que espalha doenças no estômago do população, eles respondem:
“Sim, mas estamos a procurar chumbos melhores para os dentes calmantes melhores.”
E se lhes sugerir uma “extração”, vão-se rir de si, porque ainda não aprendemos a nobre arte da odontologia que oculta a doença.
E se insistirmos eles partiriam e voltando-lhe as costas, diriam entre si:
“Muitos são os idealistas deste mundo e fracos são os seus sonhos”
Pensamentos e meditações – Kahlil Gibran
Rui Santos