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OPINIÃO/CRUZEIRO: QUE SIGNIFICA, AFINAL, O DIA INTERNACIONAL DA MULHER?

Escrito por em Março 11, 2018

QUE SIGNIFICA, AFINAL, O DIA INTERNAL DA MULHER?

A pergunta que coloco no título desta minha opinião, que regressa passadas algumas semanas de “folga”, justifica-se por motivos vários.

É recorrente assistir-se a manifestações piedosas comemorativas do 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, feita por gente que representa, em órgãos institucionais, certos partidos políticos que não têm verdadeira consciência do significado daquilo que pretendem (ou dizem) comemorar.

Por isso, lembro que a comemoração deste dia teve origem nas reivindicações de operárias de uma fábrica de têxteis em Nova Iorque, em 1857.

Revoltadas com as suas condições de trabalho, bastante precárias, as trabalhadoras fizeram greve e manifestaram-se contra os salários baixos, o excesso de horas de trabalho e contra as más condições de laboração da fábrica.
Durante a greve, deflagrou um incêndio que causou a morte a cerca de 130 manifestantes.

Terá sido este o rastilho que despoletou toda a imensa luta que se seguiria e ainda hoje se mantém.

Quando em 1910 se realizou a 2.ª Conferência Internacional de Mulheres (Copenhaga) e foi aprovada, por proposta de Clara Zetkin (figura destacada do movimento comunista internacional), a comemoração de um Dia Internacional da Mulher Trabalhadora, dia de manifestação pela emancipação das proletárias e pelo sufrágio universal, a organização das mulheres trabalhadoras era uma força considerável no movimento sindical e na participação no movimento social. Durante o século XIX e princípio do século XX assistiu-se a um crescente movimento reivindicativo das mulheres por melhores condições de trabalho e de vida, horários de trabalho dignos e melhores salários e a uma maior intervenção nos grandes acontecimentos revolucionários, como os que marcaram a Comuna de Paris. Paralelamente, intensificou-se o debate ideológico entre as feministas e as marxistas revolucionárias sobre a emancipação da mulher, com destaque quer para as teses defendidas por Clara Zetkin, quer pela sua acção na organização do movimento internacional de mulheres proletárias. Estes factores, entre outros, concorreram para que fosse aprovada a proposta de Clara Zetkin: «Em acordo com as organizações políticas e sindicais do proletariado nos seus respectivos países, as mulheres socialistas de todos os países organizarão todos os anos um dia das mulheres (…). Este dia das mulheres deve ter carácter internacional e ser cuidadosamente preparado». Para além desta proposta, as 100 delegadas, oriundas de 17 países, aprovaram várias outras resoluções: contra a invasão da Finlândia pelas tropas russas; pela manutenção da paz; pela protecção social das crianças e das mulheres trabalhadoras; pelo sufrágio universal.

Ora bem. Porquê e para quê esta conversa toda, cujo último parágrafo (a negrito) constitui um plágio, na íntegra, de um texto a que tive acesso?

Respondo, simplesmente, que o meu objectivo é o de lembrar a toda a gente que estas datas históricas não são para comemorar por hábito, por tradição, sei lá, apenas porque sim, porque é bonito, porque fica bem, prontos!

Na verdade, que curioso é verificar que há forças políticas (e não só) que todos os anos surgem com iniciativas comemorativas de tal data, sem que a sua actuação diária tenha um mínimo de correspondência com os valores que a mesma representa.

Pelo tal hábito, tradição ou seja lá pelo que for, estes intervenientes na nossa vida social mandam umas bocas a assinalar esse dia que, como atrás vimos, tem no seu bojo muita luta, muito sofrimento, muita heroicidade, enquanto que a sua prática diária desmente frontalmente as suas piedosas palavras.

O facto de as mulheres, ainda hoje e em pleno século XXI, continuarem a ser tratadas como seres inferiores, não terá responsáveis?

– Quando determinados governos, formados por esses partidos e outra gente que lhes é próxima, combatem com todas as poderosas armas que possuem qualquer luta que se promova em defesa da dignidade de quem trabalha, tendo como certo que as mulheres são o elo mais fraco da cadeia laboral e, por isso, as primeiras vítimas da sanha patronal sempre protegida pelo poder constituído, qual é o espaço que lhes sobra para uma coerente comemoração do 8 de Março?

Deverá ser mesmo por isso que, enquanto estes de que venho falando fazem umas festinhas a propósito para ficarem bem na fotografia, a qual será abundantemente estampada na indigente “informação nacional” ao seu exclusivo serviço, os outros, aqueles que têm consciência de que a luta pela emancipação plena da mulher está longe de ter terminado, não abandonam a longa batalha encetada, honrando por isso a memória dos acontecimentos que se comemoram.

Melhores condições de trabalho e de vida, horários de trabalho dignos, melhores salários, eram reivindicações defendidas pelas operárias e outras trabalhadoras já naquele tempo.

Passado mais de um século, e depois de muitos avanços conquistados nestas e noutras áreas, verificamos hoje que alguns dos “comemorantes” tudo fazem para fazer regredir a situação das relações de trabalho a tempos anteriores aos acontecimentos de que venho falando.

À margem destas hipocrisias avulsas, inconscientes umas e mal-intencionadas outras, o mundo continua a mover-se.

E é por isso que, honrando o verdadeiro significado deste marco histórico na vida colectiva dos povos de todo o mundo, se vai realizar no dia 10 de Março uma manifestação nacional em Lisboa. Que é de festa, sim senhor. Mas fundamentalmente de luta, por muito que os embarrigados democratas de fachada o não compreendam.

Um bom fim-de-semana.

Adventino Amaro